sábado, 11 de julho de 2009

Aforismos para a Sabedoria de Vida, Por Schopenhauer

Se a um estado livre de dor acrescenta-se a ausência de tédio, então se alcança a felicidade na terra no que tem de essencial; o resto não é mais que quimera. Segue-se daí que nunca se devem comprar prazeres à custa de dores, tampouco do risco, visto que isso seria pagar algo negativo e quimérico com algo positivo e real. Em contrapartida, há benefício em sacrificar prazeres para evitar dores. Em ambos os casos, é indiferente se as dores seguem ou precedem os prazeres. Não existe verdadeiramente loucura maior que querer transformar este teatro de misérias e lamentos em um lugar de prazer e buscar prazeres e alegrias, como tantos fazem, em vez de tratar de evitar a maior quantidade possível de dores. Há alguma sabedoria naquele que, com um olhar sombrio, considera este mundo como uma espécie de inferno, e não se ocupa senão de proporcionar-se um abrigo onde esteja a salvo das chamas. O tolo corre atrás dos prazeres da vida e colhe desilusões; o sábio evita os seus males. Quando, apesar desses esforços, não se consegue evitá-los, a culpa é do destino, não da própria tolice; porém, na medida em que o consiga, não será desiludido, porque os males que houver evitado são muito reais. Ainda que seu esforço em evitá-los tenha sido excessivo, sacrificando prazeres desnecessariamente, não perdeu nada realmente; pois todos os prazeres são ilusórios, e lamentar por sua perda seria mesquinho, e mesmo ridículo. A incapacidade – encorajada pelo otimismo – de apreender essa verdade é a fonte de muitas desgraças. Assim, nos momentos em que estamos livres de dores, desejos inquietos fazem brilhar à nossa vista as quimeras de uma felicidade que não tem existência real e nos seduzem a persegui-las; com isso atraímos a dor, que é indiscutivelmente real. Então lamentamos a perda desse estado de ausência de dor que, como um paraíso perdido, ficou para trás, e em vão tentamos reverter o que está feito. Parece que um espírito maligno, com visões de nossos desejos, ocupa-se constantemente em nos distanciar do estado de ausência de sofrimento, da felicidade suprema e real. O jovem irrefletido imagina que o mundo existe para ser desfrutado; que é a morada de uma felicidade positiva; que os homens não a alcançam porque são incapazes de superar as dificuldades. Sua crença é reforçada pelos romances e poesias, e por essa hipocrisia que o mundo exibe onde quer que seja e sempre em favor das aparências, assunto ao qual retornarei em breve. Daí em diante, sua vida é uma busca mais ou menos deliberada de uma felicidade positiva que, como tal, diz-se consistir de prazeres positivos. Não devemos esquecer os perigos aos quais se expõe nessa busca pela felicidade. Isso leva à persecução de coisas que não existem de maneira alguma e, em regra, acaba por conduzir a uma desgraça muito real e positiva, que se manifesta como dores, sofrimentos, enfermidades, perdas, cuidados, pobreza, desonra e outras mil calamidades. O desengano chega tarde demais. Se, pelo contrário, se obedece à regra aqui exposta, se o projeto de vida é dirigido com o fim de evitar o sofrimento, ou seja, se manter afastado da necessidade, da enfermidade e de qualquer outra moléstia, então o objetivo é real. Assim, será possível alcançar algo, e tanto mais na medida em que o plano não for atrapalhado pela persecução dessa quimera da felicidade positiva. Isso concorda com a passagem de Goethe, em Wahlverwandtschaften [as afinidades eletivas], na qual Mittler, que sempre tenta levar felicidade aos demais, diz: Aquele que quer livrar-se de um mal sempre sabe o que quer; aquele que busca mais do que tem é mais cego que um acometido pela catarata.

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